Thursday 22 November 2012

#10

Estou cansado. Cansado, mesmo. Cansado de passar a vida a queixar-me de estar cansado, cansado desta estupidez, desta melancolia, desta existência tão dada ao pendor depressivo e com uns pontos irritantemente pessoanos, do estar assim mas não fazer absolutamente nada para deixar de estar.
Sinto falta da minha casa, sinto saudades de pessoas que nunca existiram, estou triste comigo por nunca conseguir aprender a relaxar, a estar. E não deixa de ser tão irónico, já que me digo uma pessoa tão imediata e pronta a "estar-só-aqui". Estou só aqui, acho eu. Mais do que muita gente que me rodeia. Estou, . Mas estou tanto, todos os dias, e todos os dias, de há uns tempos para cá, são tão todos iguais, sem nada de realmente novo e bom, que me canso de estar. Não gosto do meu quarto, é pequeno demais, não me sinto em casa, aqui. Não gosto assim tanto dos meus colegas de casa. Nem do que conheço, nem do novo. E faço um esforço, digo à minha namorada "ele é tão fixe, gostei tanto dele!" mais para me convencer a mim mesmo, do que por ser exactamente verdade.
Estou triste por não conseguir escrever. Só me sai merda. Mas devo tentar. Tentar todos os dias, não pensar muito nisso. Só que ler, depois, custa. E tentar todos os dias custa. E estar num sítio onde não há nada para fazer, ninguém com quem estar, custa. Custa-me muito. Não tenho as dores dos outros, não me interessa particularmente saber como é que x ou y lidaram ou lidam com a ou b. Não sei como lidar com isto, só sei que não quero estragar nada de bom, daquilo que tenho. Ainda vão sendo algumas coisas, no meio de tudo, mas hoje apetece-me, como tantas vezes, focar-me nas que me magoam e entristecem. E entristece-me estar sozinho, não sei se por culpa minha, ou não (provavelmente, sim), mas entristece. Querer amigos e ter dois ou três longe. Não ter só alguém com quem sair, com quem estar. Uma pessoa, uma pessoa, que seja, com quem me apeteça estar mas depois, ao estarmos juntos, não fique imediatamente com vontade de fugir para casa, fechar-me no quarto a olhar para o monitor, sem conseguir escrever nada, a olhar para as mãos e a pensar "em que porra de parte do caminho é que fiquei, que já não me encontro, nisto?"
Em que porra de parte do caminho é que fiquei? Olho para mim e não consigo ver nada. O rosto de sempre, mais magro, eventualmente, as mãos de sempre, a doença de sempre. Mas sem letras nem palavras nem nada, sem nada de realmente mal, mas sem me sentir realmente bem. "O mal de ser humano", dir-me-ão os mais filosóficos. Talvez. O mal de se ser humano, sim. Mas não me interessa o que é, ou que todos o tenhamos e sentimos. Interessa-me saber, ao certo, ao fim e ao cabo, como deixar de sentir isto.
Interessa-me ter amigos, inventar amigos que se materializem de repente, do nada, e que estejam e sejam comigo. Inventar sítios onde me sinta em casa.
Ter um quarto onde consiga dormir. Onde consiga andar de um lado para o outro, quando preciso de pensar. Ter uma casa.
Ser uma casa.

Wednesday 2 May 2012

#9

Hoje é para dizer que:

i) estou cansado. Apetece-me estar com pessoas, mas não me apetece estar com pessoas. Não me apetece, acima de tudo, ter de conversar, ter de me fingir preocupado com as coisas dos outros. E também não quero estar sempre só eu a falar das minhas coisas, dos meus problemas, era capaz de nunca me calar com isso, e depois as pessoas não me suportam. Um bocado por causa disso, tenho um pequeno rancor e ódio por toda a gente: porque sei que só estão comigo por frete, por pena, porque "o coitadinho está mal, bolas!, vamos lá fazer-lhe companhia uns bocaditos, para ver se ele se anima!" O coitadinho está mal, de facto, e queria companhia um dia inteiro, não era uns bocadinhos. Queria estar com pessoas que falassem de coisas que interessam, para não ter de estar o dia todo a queixar-se, a ouvir pessoas queixarem-se. Queria um esforço mútuo, dele e dos outros, para que se estivesse bem, ou, pelo menos, um pouco melhor. E, depois, apetece-me estar com pessoas, mas quando elas chegam e é só chato e aborrecido, não há conversa nem entusiasmo, nem nada, a vontade vai-se, e mais valia ficar sozinho a ler e a escrever e a ouvir música. Mas quando estou sozinho a ler e a escrever e a ouvir música sinto-me um espectro desolado que precisa de companhia. E isso cansa. Muito.

ii) estou numa idade fodida. Não tenho idade suficiente para as mulheres da minha faixa etária. Preferiria estar com mulheres da minha faixa etária, são mais interessantes e têm mais para me oferecer. Mas sou novo demais. Devia ter mais uns 30, 40 anos. Que as mulheres da minha idade precisam de homens "maduros", de homens vividos, que leram muito e estão já amargurados com a vida, ácidos e cínicos e sarcásticos e pouco ou nada ralados com o amor. Velhos. Portanto, não podendo avançar cronologicamente, viro-me para as minhas actuais colegas de curso, que as há também interessantes, apesar de tudo. Mas, para essas, sou já velho demais. Se as mulheres da minha idade querem "senhores" com 50/55/60, porque esses, sim, são "bons vivants", as mais novas querem meninos de corpo torneado, preferencialmente esqueléticos, desde que com costelas e abdominais visíveis, cabelos ao estilo cow-lick, burros, mas jeitosinhos, que toquem pelo menos berimbau, desde que toquem numa banda de indie-coiso, ou que sejam MCs num agrupamento de rap/hip hop e passem muito tempo em bares da moda, à noite. Enfim, querem o estereótipo dos Morangos com Açúcar. Procuram um moranguinho, e o pior é que os há. Logo, conclui-se que estou novo demais para as mulheres da minha idade que interessam, e velho demais para as mulheres mais novas que interessam. Fuck this shit...

Wednesday 1 February 2012

#8

Quero falar só porque sim. Dizer coisas. Inconsequentemente. Quero tanto esta coisa parva, meio ridícula, mesmo, da auto-comiseração. Quero. Quero. Quero. Eu. Sempre. E, que se foda, não me ralo. Estou rodeado de egoismozinhos estúpidos e imbecis, por vezes disfarçados de altruísmos com segundas intenções ("olha para mim, sou tão altruísta, tão abnegado, valho tanto, porque dou a entender que me ralo com tudo e todos, e venho sempre em último lugar!"), rodeado todos os dias, a toda a hora, de mártires e vítimas e pessoas cujos ideais valem sempre tanto, tão mais que os meus - que nem sei ao certo quais são.
Perdão: sei quais são. Os meus ideais são ideais de um certo amor. De uma certa co-relação interindividual, de simbiose, de sustento, de crescimento e fortalecimento. Aborrece-me a suposta independência que se procura de forma assustadora nos dias que correm. Essa coisa de todos nos valermos por nós próprios. Acabo, claro, preso nisso. A achar-me sozinho, abandonado, nunca preferido em relação a nada, a nunca ter ninguém com tempo para mim, mesmo que eu vá tendo tempo para as pessoas que importam a sério. É que nem essas retribuem nada. Quem tem sempre de entender sou eu, ora! Eu é que não funciono bem. Eu é que estou mal por acreditar - por sentir - que tudo, na vida, se processa numa base muito simples: a da reciprocidade. Recebemos o que damos e damos o que recebemos. É só isto. Resume-se tudo a isto. Dou amor a alguém. Se não o recebo de volta, fico triste, porque o estou a dar. Se trato mal outrém, não posso esperar que me venham trazer beijos e abraços e carinho e uma genuidade de estar e ser tremenda. Sou, como sempre, essa é talvez a minha característica mais profunda, um homem de e para mulheres. Preciso de me dar e de estar com mulheres. De ter uma companhia independente de mim, mas que me busque e que sinta que precise de mim. Nem que seja por haver uma química sexual maravilhosa. Mas que precise de mim e que me deixe o abandono total de precisar dela. Porque somos humanos, sei lá... precisamos uns dos outros. A ciência não sabe explicar, com toda a sua lógica e física e matemática, a necessidade de ouvir alguém que nos interesse falar das coisas mais banais enquanto se toma um café. Podem haver genes e hormonas e feromonas e um instinto de sobrevivência, mas se fosse só isso não sofríamos, não tínhamos desgostos de amor, não pensávamos nem reflectíamos nem sentíamos saudades. Éramos como insectos ou bichos selvagens, que esses também vão mantendo a sua espécie em permanência e em sobrevivência através de meros instintos biológicos. Nós não somos animais, somos pessoas. Há, apesar de tudo, apesar do ténue que essa barreira possa ser, do ponto de vista da biologia e da física e da química, uma separação. Somos mais que "animais racionais". Eu sei que somos. Vejo-o e sinto-o e vivo-o.
Dou por mim a sofrer a maior percentagem de tempo em que vivo e isso assusta-me. Sou feliz algum tempo. Muito feliz, sim, tão feliz que julgo mesmo esse facto ocasional compensar todos os momentos de angústia e arrastar emocional e existencial. Às vezes compensa. Mas a minha necessidade de companhia, de cumplicidade, de encanto, de fisicidade no meio e por fora e por dentro de tudo isso é o que é, e não se compadece das pessoas fúteis e egocêntricas que não o vêem. O meu egoísmo latente ressente-se do ainda maior egoísmo dos outros - maior, quanto mais não seja, porque velado, porque oculto sob uma capa de "estamos aqui, agora, e é assim que isto funciona porque os filósofos e os físicos e os matemáticos e os teólogos dizem que sim". Encontro pessoas. Acredito nelas. Dou-me todo. Mas elas nunca o notam, não lhes convém notá-lo ou, na minha ingenuidade típica, simplesmente não o conseguem ver. Não percebo porque é que as mulheres da minha vida não percebem que os meus "melodramas" nunca são só isso. São verdades sentidas, são dores, são saudades antecipadas e sobretudo saudades de uma coisa que está ali a acabar mas que sei que está mesmo a acabar, e não quero, não consigo deixar que suceda.
Tenho tido sempre gente muito interessante na minha vida. Mulheres lindas, inteligentes. Mas algumas, peço imensa desculpa pela frontalidade, são muito burras, emocionalmente. Vivem de desculpas e de ficções. Não me podem ver chorar, sofrer, arder, enlouquecer, porque isso é "jogo psicológico". Não entendem o quanto um coração se parte quando uma pessoa que amamos se vai embora sem o desejarmos. E, não, não me venham com histórias de que temos de perceber que "é o melhor para os dois"... um coração vai sair mutilado disso. Quase sempre. Sempre. Horrivelmente mutilado.

E mais havia, a dizer, mas agora não consigo. É isto. É um bocado mais que isto, mas, sobretudo, por agora, é isto.